segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Da Columbia à Internet


Em 1982, surgia pela primeira vez para o público japonês, um novo formato de mídia chamado “Compact Disc Laser”, conhecido popularmente como CD. Aos poucos (leia-se o que está escrito, “aos poucos”, não “lentamente”), esse novo formato foi tomando o lugar de seu predecessor, o vinil. Os antigos “bolachões”, discos (frequentemente) negros de doze, sete ou dez polegadas foram abandonados na busca por um som mais “nítido” e “cristalino”, sendo mantidos vivos por vários anos apenas pelo esforço de certos DJs de música eletrônica e seus fãs. Mas, com o tempo, nem os CDs sobreviveram com tanta força, sendo substituídos mais recentemente pelo formato puramente digital da mp3.

Eu realmente defendo a ideia de que o formato em que a música está não muda sua qualidade, assim como a época em que ela é lançada não a define como boa ou ruim. Sou, como tantos outros, fã de músicas lançadas na década de 1920, assim como de outras lançadas (literalmente) na semana passada. Mas não consigo negar a influência do formato em que ela se encontra nos demais aspectos que a música envolve.
O vinil é, indubitavelmente, a forma mais romântica de se apreciar um álbum. Segurar um disco, analisar a capa dele num formato grande o bastante para ressaltar seus detalhes, mas pequeno o bastante pra sermos capaz de segurar com as próprias mãos. Ver a música acontecendo com a trepidação da agulha sobre as ranhuras daquela bolacha giratória. Ouvir os primeiros ruídos, antes de a música começar, quando a agulha desce. Sentir as vibrações ecoando pelo corpo, sabendo que você faz parte de tudo aquilo.

Não é à toa que a época áurea da indústria fonográfica se deu nos tempos do vinil. Não medimos o sucesso de um filme de acordo com o número de downloads, ou de locações do dvd ou blu-ray, mas de acordo com sua bilheteria no cinema. Não existe o envolvimento que falei quando damos dois cliques num mouse, ou engavetamos um minúsculo disco prateado num aparelho e fazemo-lo desaparecer.
A rainha do rock, Wanda Jackson, gravou um show recentemente na gravadora Third Man Records, enquanto promovia seu disco “The Party Ain’t Over” (produzido por Jack White). Pouco antes de cantar a famosa “You Know I’m No Good”, da polêmica Amy Winehouse, Wanda faz uma breve declaração de surpresa:

“This next song (...) it is from the album, however Jack [White] released this one first as a single, and it’s the first time in how many years I had a vinyl! And he said ‘oh yeah, that’s what young people are wanting!’”
“Essa próxima canção (...) é do álbum, contudo, Jack [White] lançou essa como um single, e pela primeira vez em sei lá quantos anos, eu tinha um vinil! E ele disse ‘ah sim, é isso que os jovens estão querendo!’”.

Poucos são os artistas de hoje que percebem a relação de simbiose com seus fãs. Uma nova geração surge hoje, tanto de artistas quanto de apreciadores, revitalizando valores do passado que possibilitam um contato mais profundo com o mundo. Eu acredito que a falta de interesse pela compra de álbuns se desenvolveu justamente pela distância entre as duas partes interessadas (músico e ouvinte), e uma proximidade maior realmente parece ser a resposta. A referida gravadora Third Man Records possibilita isso magistralmente, permitindo contato direto com os artistas, acesso a material exclusivo para aqueles que são clientes e, inclusive, um clube especial que presenteia trimestralmente seus membros com itens indisponíveis em qualquer outro lugar (exceto, é claro, posteriormente no eBay, a preços absurdos). O pacote trimestral consiste sempre em um LP de doze polegadas, um single de sete e um item bônus (podendo ser uma camiseta, cartão postal, livro, dvd, entre outros). Quando o fã se sente especial por estar investindo no material, é inevitável o interesse intensificado, e se sentir especial significa sentir que está fazendo parte da experiência.

Imagino que possam existir pessoas que preferem ouvir suas músicas favoritas isoladas do contexto de um álbum, num formato digital no qual eu não vejo graça. Não acho que essas pessoas não “apreciem” manifestações artísticas em sua plenitude. Uma das características mais belas da arte é justamente a capacidade dela de refletir o apreciador (recitando Oscar Wilde, no prefácio de “O Retrato de Dorian Gray”). Cada música, cada filme, cada quadro, cada fotografia, cada peça é incomparavelmente apropriada de acordo com o espectador e seu atual estado emocional. Não vejo como realmente curtir o honesto rock n’ roll do AC/DC em um momento de depressão, ou como se divertir com o som de James Brown sem sequer pensar em dançar. Alegar “fulano não ouve música de verdade” se baseando em gostos pessoais realmente não faz sentido. A única coisa possível de se dizer (apesar de não ser muito educada!) seria algo do gênero “não entendo como pode você pode ouvir isso, eu não vejo isso como música”.

Julgar determinado artista ou fã é fácil e pode até ser divertido quando existe a companhia apropriada, mas nunca é sensato esquecer a intensidade da relação de cada indivíduo com sua arte, já que ela propõe uma função única na sociedade. Cada peça “funciona” pra seu público alvo. Cada pessoa é perfeita pra sua peça. E nenhuma arte é completa enquanto isso não for entendido, consciente ou instintivamente.

"And they call me mad?
I'm not mad!
I am a god!"

                    - Conan O'brien

domingo, 21 de outubro de 2012

Prensagem de Teste

O mundo da cultura pop gira num caos quase absoluto. Sucessos absurdos vêm e vão numa velocidade impossível de se acompanhar. Durante quinze segundos, algum músico, escritor, ator, diretor, trapezista ou qualquer outro que ousou, pode ser um rei. Ganha rios de dinheiro através daquilo que joga ao mundo, sem esquecer, claro, do reconhecimento de leigos e profissionais dos quatro cantos do globo. Acabado seu período de vitória, quase não existirão mais aqueles que ainda se dizem fãs ou admiradores.

Até alguns anos atrás, a prática comum quando precisávamos de água era chegar em algum poço, descer um balde com uso de uma corda, recolher o precioso líquido, trazer o balde cheio pra casa e fazer todo o uso possível e necessário daquilo que buscou. Quando existe a vontade de assistir o mundo pop, a necessidade de direcionamento é inevitável. A menos que exista um foco, só existe uma superficialidade de conhecimento ainda mais drástica do que o popular já está acostumado. Com esse blog (em si, uma manifestação moderna da necessidade de acompanhar o mundo das superficialidades com um disfarce de profundidade) trarei aquilo que julgo digno de atenção no mundo do pop, especificamente, da música. Farei referências a obras clássicas da música, literatura, cinema e teatro, mas essas referências serão nada mais que a corda. A água que vocês, leitores, vão puxar, é aquilo que eu preciso pra não me afogar no tsunami cultural em cima de nós, o povo. Nós, que criamos (sem querer/perceber) a cultura pop. Nós que demos o nome pra ela.

"I wish I was purple
'Cause I'm feeling blue
I'm not looking for love
But a good fuck will do."

                      - BP Fallon