segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Blundering Trough Song

Quem me conhece sabe que minhas preferências musicais estão quase sempre no passado, principalmente entre os anos 1930 e 1970. Dentre os pouquíssimos artistas atuais que realmente gosto, existe um elemento comum que é o contato intenso com aquilo que já passou. Entre os modernos, aquele com maior contato com o passado e, portanto, que mais gosto é Jack White, com sua veia poética e caminhos profissionais pouco usuais. 
Membro comum de várias bandas dos anos 1990, iniciou um projeto com sua então esposa, Meg White, chamado The White Stripes. Depois de três discos lançados e algum nível de reconhecimento, aparece a saudosa Seven Nation Army, quase que uma peça folclórica da nossa geração, não é abuso considerá-la a mais famosa música dos anos 2000. Uma carreira de 10 anos tendo Meg como única companheira de banda ajudou a alavancar seu segundo projeto, The Raconteurs, com um foco mais abrangente que os Stripes (provavelmente associado à maior quantia de membros na nova banda), os Raconteurs logo alcançaram sucesso comercial e crítico. Em 2009, dois anos antes do fim da primeira banda citada aqui, nasce um terceiro grupo, The Dead Weather, usado para inaugurar a recém-nascida gravadora Third Man Records. Sem o mesmo impacto das duas bandas anteriores, o Dead Weather consegue um espaço respeitável no círculo artístico com suas influências eletrônicas e blueseiras. Mesmo sendo difícil de acreditar que esse sucesso aconteceria sem a carreira prévia de todos os membros da banda (na guitarra, Dean Fertita, do Queens of the Stone Age, Jack Lawrence no baixo, dos Greenhornes e Raconteurs, Alison Mosshart no vocal, do The Kills e, na bateria, Jack White), algumas peças genuinamente interessantes surgiram.
Então, depois de três sucessos (dois considerados supergrupos), o Sr. White resolve, este ano, assumir uma carreira solo, e logo no primeiro semestre de 2012 o disco Blunderbuss aparece nas lojas. Admito que fiquei, como todo bom fã de White Stripes, empolgado e realmente curioso, e, logo na primeira audição (dentro do metrô lotado, na hora do rush de São Paulo) considerei que havia achado uma nova pérola da nossa época. Mas mesmo com músicas realmente chamativas como On and On and On, Weep Themselves to Sleep e I'm Shakin' (essa última sendo um cover de Little Willie John) algo não me parecia certo. Recentemente rodei o disco mais uma vez e acabei entendendo minha opinião dividida.
Peças como Journey to the Centre of the Earth (Rick Wakeman), Dark Side of the Moon (Pink Floyd), Tubular Bells (Mike Oldfield) ou Led Zeppelin IV (Led Zeppelin), citando pouquíssimas, precisavam ser apreciadas por inteiro. Um braço ou uma perna ainda podem ser de algum uso quando separados do corpo, mas perdem sua verdadeira função e força quando amputados, essa é a analogia mais fiel ao poder de cada música que integrava os referidos discos. Uma história contada através de uma série de canções é uma herança cultural antiga e ainda muito valiosa, tanto num aspecto dramático quanto poético. Robert Plant, vocalista do extinto Led Zeppelin, revelou em entrevista que não gostava de laçar singles (discos contendo de duas a três músicas) justamente por reconhecer o valor do recurso que menciono. Infelizmente, esse aspecto de continuidade é ausente do Blunderbuss.
Uma música atrás da outra no disco de Jack White faz referência a casos amorosos desastrosos, existe um elo unindo cada faixa, mas a variedade enorme de estilos (cobrindo desde um rock influenciado por hip hop de Freedom at 21 até a balada suave de I Guess I Should Go to Sleep) e repetição incansável do mesmo tema não criam uma história, mas um aglomerado de reclamações, uma ótima coletânea.
Ainda considero White como sendo um dos últimos poetas da música pop, com a habilidade e talento necessários para se criar uma obra memorável, mas a mentalidade (assumida pelo próprio) de se tratar cada música como o lado A de um single acaba por roubar o mundo dessa possibilidade.

"Like just 'bout every other tale
Someone's gonna die in the end"
               - Jack White

(texto escrito enquanto o autor ouvia Blunderbuss no modo shuffle.)

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